terça-feira, 4 de novembro de 2008

PETA E A CULTURA PORNOGRÁFICA

PETA E A CULTURA PORNOGRÁFICA


Uma Análise Feminista de “Eu Prefiro Ir Nua do que Usar Pele”


por Carol Adams


Tradução: Coletivo Madu


Muitas de nós em Feministas pelos Direitos Animais temos fortes sentimentos pela campanha publicitária do PETA, e eu quero dividir algumas das preocupações que surgem de alguém como eu, posicionada simultaneamente no movimento feminista e no movimento de defesa animal.


1. Uma conexão existe entre o tratamento de mulheres e o tratamento de animais. Esta conexão é basicamente um processo epistemológico no qual um sujeito se conhece através da objetificação de outros. Filosoficamente falando, epistemologia se refere a como nós sabemos o que sabemos e como ganhamos conhecimento. Uma epistemologia patriarcal responde à diferença (como raça, sexo, espécie) rotulando aquelas e aqueles que são diferentes como “outros”, e então objetificando quem são “outros”, de modo que sejam usados instrumentalmente. Ecofeministas chamam isto de uma “hierarquia de valores”, no qual o poder é inscrito sobre quem possui menos valor e este indivíduo é, portanto, visto como tendo menos valor. Uma feminista cunhou o termo “somatofobia” para se referir à hostilidade ao corpo. Em nossa cultura, o corpo tem menos valor que a mente ou a alma; logo, qualquer pessoa igualada com o corpo irá também ser não valorizada ou sub-valorizada. Este conceito nos ajuda a reconhecer o relacionamento entre diferentes formas de opressão: aqueles e aquelas igualadas com corpos (como pessoas de côr, animais e mulheres) ao invés de mentes ou almas (como pessoas brancas, seres humanos e homens) são oprimidas em nossa cultura por causa desta equação com o corpo e com umas às outras.


2. O problema é que este processo epistemológico, se sucedido, se torna invisível, e nós pensamos que estamos debatendo ontologia. Em outras palavras, o debate é mantido no nível de quem somos (ontologia) ao invés de como nós adquirimos o conhecimento de quem nós somos. Deixe-me dar um exemplo específico ao movimento de direitos animais. Algumas pessoas realmente vêem animais como “carne”: “para que outra coisa eles existem?” elas pensam, “eles existem para serem nossa carne”. Como sabemos, não há nada intrínseco à existência de um animal que o faz “carne”; é a posição do conhecimento de alguns seres humanos que os vê desta forma. Uma maneira ecofeminista de colocar isto é que quem está “acima” na hierarquia de valores, neste caso seres humanos, vê aqueles e aquelas que estão “abaixo”, neste caso animais, como usáveis, e desta visão vem a conclusão de que isto é o porquê de animais existirem: para serem de uso.


3. É também o mesmo processo epistemológico que vê corpos de mulheres pornograficamente. Pornografia foi historicamente uma maneira de homens instituírem seu estatuto de sujeito tendo outros que têm o estatuto de objetos. Como Susanne Kappeler diz em A Pornografia da Representação, a subjetividade dominante na cultura patriarcal é construída através da objetificação de outros. Aqui está um exemplo deste tipo de análise, uma análise clássica por Laura Mulvey do que é chamado o olhar masculino: “Em um mundo ordenado por desequilíbrio sexual, o prazer em observar foi dividido entre ativo/masculino e passivo/feminino. O olhar determinante masculino (humano) projeta sua fantasia sobre a figura da fêmea (humana), que é estilizada de acordo. Em seu tradicional papel exibicionista, mulheres são simultaneamente fitadas e expostas, com sua aparência codificada para forte impacto visual e erótico para que possa ser dito que elas conotam “fitabilidade”. Esta dificuldade em perceber o quanto a subjetividade confia nesta “fitabilidade” também explica a atração de uma campanha “nua”, porque ela vai ter atenção da mídia, já que a mídia é a fonte primária de encorajamento da “fitabilidade” da mulher. Esta dificuldade em perceber como a subjetividade dominante confia nesta “fitabilidade” também explica os problemas inerentes ao debate da campanha “nua” - algumas pessoas o vêem de uma forma, enquanto outras a vêem de outra. Em outras palavras, porque o epistemológico permanece invisível nós terminamos debatendo o ontológico.


4. Dada esta análise, a campanha “eu prefiro ir nua do que usar pele” é intrinsicamente problemática, provocando um debate de meios/fins entre nós. Mas a reviravolta adicional que ocorre com o anúncio da Pati Davis não é somente sua aliança com a Playboy, a qual fez o mal a mulheres através da pornografia um entretenimento de homens (porque ela leva adiante a objetificação da mulher, e reproduz dominação sexualizada), mas a preocupação especifica da bestialidade e a associação de Hugh Heffner com esta forma de pornografia. Sobre isto, ver Linda Lovelace, Ordeal, especificamente a p. 194: “Então Heffner disse que apesar de ele gostar de Garganta Profunda, ele estava mais interessado pelo filme que eu faria com um cachorro (sexo forçado por seu marido violento descrito nas páginas 105-113)”.


“Oh, você viu aquilo?” Chuck (seu marido violento) disse. “Oh aquilo foi ótimo,” Heffner disse, “Você sabe que nós já tentamos várias vezes, tentamos colocar uma garota e um cão juntos, mas nunca funcionou.” “Sim, isso pode ser bem complicado,” Chuck disse, “a mina tem que saber o que ela está fazendo.” “Isso é algo que eu gostaria de ver,” Heffner disse, “Eu acho que vi todo filme de animal (sic) já feito mas–”. Então Chuck oferece Linda como uma participante “voluntária”.


E então nós voltamos à minha primeira premissa, de que há uma conexão entre o tratamento das mulheres e o tratamento dos animais. Neste caso, o ponto de interseção é o uso pornográfico da bestialidade, no qual aquelas e aqueles de nós de atividade no movimento contra violência contra mulheres sabemos que é frequentemente uma ocasião para violentadores/estupradores maritais forçarem sexo entre um animal e sua parceira feminina. Eles tentam reproduzir a pornografia que consomem.


Nossa reclamação não é apenas a nº 4, por exemplo, que esta campanha publicitária – para qualquer pessoa com conhecimento do testemunho de Linda Lovelace – dá dicas de associação de Hugh Heffner com bestialidade, mas mais compreensivelmente o encontrado teoricamente na minha primeira premissa: que o nº 4 é inevitável por causa da posição epistemológica da objetificação. Vamos deixar isto claro. O problema não é que o PETA falha em reconhecer a interconexão do tratamento dos animais e o tratamento das mulheres. O problema é que, ao menos que reconheçam violência sexual masculina e como esta objetificação toma lugar perante o patriarcado, não vão verdadeiramente entender a violência contra animais.


Para um projeto no qual eu estou trabalhando sobre pornografia e animais, eu estive conversando com feministas que fazem campanha contra a pornografia ao redor do país. O que eu achei fascinante é que, apesar de eu não poder presumir que uma feminista, só porque ela é feminista, leu As Políticas Sexuais da Carne, eu tenho segurança em presumir que feministas anti-pornografia o leram. Como o reconhecimento do meu trabalho estava acontecendo, quando eu ligava para feministas eu não sabia perguntar a elas sobre o que elas acham que está acontecendo com pornografia que apresenta animais, me fez perceber que estes grupos de feministas realmente compreendem e entendem como o processo de objetificação afeta animais, sobre o que nós ativistas dos direitos animais tentamos educar as pessoas. Eu descobri uma afinidade entre sua análise e nossa análise. Esta é uma razão pela qual a campanha “nua” é tão perturbadora: um grupo aliado, muito familiarizado com a experiência de Linda Lovelace, é agora apresentado com uma campanha que anuncia que direitos animais não compreendem a objetificação de mulheres em geral, e especificamente sobre a origem do patriarcado na opressão de animais. Isto, para mim, é muito triste.


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Alguns exemplos das campanhas do Peta:

sadiefrost_peta.jpg (imagem JPEG, 450x604 pixels)

Peta-0.jpg (imagem JPEG, 400x518 pixels)

eva-mendes-peta-ad-01.jpg (imagem JPEG, 400x522 pixels)


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Mais sobre Linda Lovelace:
“A Verdadeira Linda Lovelace”, de Gloria Steinem
http://feminista.wordpress.com/2006/12/26/linda-lovelace/#more-1

Vivendo entre Comedores de Carne: Uma entrevista com Carol Adams

Vivendo entre Comedores de Carne:

Uma entrevista com Carol Adams


Satya: Uma Revista de Vegetarianismo, Ambientalismo e Defesa Animal

vol.2, nº 6 (Dezembro de 1995), págs. 6-7, 12


Tradução: Coletivo Madu


Carol Adams esteve trabalhando dentro dos campos de violência contra mulheres e crianças e vegetarianismo e defesa animal por mais de vinte anos. Ela é a autora de vários livros, mais notadamente As Políticas Sexuais da Carne: Uma Teoria Crítica Feminista-Vegetariana e Nem Homem nem Fera: Feminismo e a Defesa dos Animais. Com Josephine Donovan, ela editou dois volumes sobre feminismo e a questão animal. Ela vive nos arredores de Dallas, Texas.


P: Vamos começar com a pergunta óbvia. Como você vive entre comedores de carne?

R: Eu acho que uma maneira como eu convivo com onívoros é perguntar a eles e a elas sobre isso. No avião ontem à noite eu estava sentando ao lado de um psicólogo infantil e nós conversamos sobre o fato de eu ter pedido uma refeição vegetariana e ele ter comido uma galinha morta. Foi bastante fascinante porque, quando você diz que você está escrevendo sobre isso, então você pode dizer: “Então me diga: você disse que sabe que é eticamente errado; então o que acontece quando você se senta para comer carne?” Ao invés de ser vista como alguém dizendo “Olha, você está fazendo algo errado; então por que continua fazendo isso?” Eu posso fazer uma pergunta que leva as pessoas a refletirem sobre qual o processo que está cortando-as de sua própria percepção ética. Ele falou sobre ter um buraco em sua consciência e eu disse “Sim, mas eu não acredito, porque nossa cultura inteira diz que está tudo bem.” “Bem,” ele disse, “Nós temos um buraco coletivo em nossa consciência.”


P: Você sente raiva?

R: Quando o New York Times tem um artigo completo sobre o crescimento das fazendas-fábricas com porcos e o efeito disso no ambiente e nas pessoas e ignora completamente os animais, eu sinto muita raiva. Mas eu pego a raiva e a uso interpretativamente: O que isto representa? O que está acontecendo aqui? Então, teoricamente, eu posso me engajar ainda mais, porque eu quero tentar entender o fato e como mudá-lo. Pessoalmente, eu acho que percebi que precisava começar a negociar com as pessoas sobre o que elas iam pedir em um restaurante, e me dar permissão para dizer o que eu quero dizer. Algumas vezes o que onívoros fazem é tão aberto a análise que isso me deixa pasma. Então eu acho que o que eu fiz foi pegar aquela constante frustração enlouquecedora e a raiva e eu finalmente movi isso tanto que não mais me paralisa e imobiliza e eu continuo vendo toda esta coisa como um processo. Afinal de contas, eu costumava ser uma comedora de carne. Eu estou vivendo entre pessoas que ainda não completaram o processo pelo qual vegetarianas e vegetarianos passam.


P: Você acha sempre útil voltar naquele estado mental e pensar “Bem, como eu fiquei negando isso?” E como nós negociamos com nossas famílias?

R: Eu acho que uma maneira como nós pessoalmente lidamos com isso foi nos exilarmos. Minha família inteira está no norte, eu estou no Dallas. Eu não vou pra casa para a maioria dos importantes rituais que eu geralmente teria que aguentar. Então, eu posso exercitar esse tipo de controle. Eu tive sucesso em negociar um churrasco vegetariano, onde as únicas coisas preparadas foram hambúrgueres e cachorros-quentes vegetais. E foi um grande sucesso, mas eu tive que negociar isso com antecedência. Alguns dos membros da minha família têm muito interesse em vegetarianismo, enquanto alguns dos membros da minha família são muito controladores... Então, nós não conversamos sobre isso. Afinal de contas, onívoros vivem entre onívoros. Tudo que eles e elas fazem é refletido de volta como correto. Outra forma como eu lido com isso é através de um entendimento feminista do processo social. Para mim está se tornando mais e mais profundo que o modo como a pornografia reflete uma mensagem sobre quem as mulheres são é o modo que uma cultura onívora reflete uma mensagem sobre o quê – e não quem – os animais são. Então, tentar reconfigurar nossa conceitualização é muito importante.


P: Você acha que devemos retrucar?

R: Eu acho que é importante retrucar em algumas vezes. Primeiro de tudo, eu acho que vegetarianas e vegetarianos pensam mais literalmente que outras pessoas, porque você está restaurando o “referencial ausente”. Nós não estamos vendo comida, nós estamos vendo um cadáver, estamos vendo animais mortos. Porque nós pensamos literalmente assim como metaforicamente, nossa tentativa de mover para o literal irá levantar um certo grau de hostilidade e perturbação porque nossa cultura em geral quer se mover para longe do literal. Ela quer se desprender. Por exemplo, nós não queremos saber de onde nossas roupas vêm. Nós não queremos saber que a roupa está sendo feita por crianças ou mulheres em condições terríveis. Nós não queremos restaurar este referencial ausente, nós não queremos que a verdade literal do que nossa cultura produz para consumirmos seja conhecida. Segundo, eu sempre digo que vegetarianas e vegetarianos não devem se engajar no assunto de vegetarianismo se há um animal morto presente e sendo comido, porque há muita tensão. O onívoro terá uma maior necessidade de justificar o que está fazendo, mesmo que não esteja consciente disso, porque o está consumindo no momento.


P: Você concorda com Karen Davis que nós precisamos parar de nos desculparmos?

R: Eu adoro isso. Nós realmente precisamos parar de nos desculparmos, mas eu acho que Karen agiria diferente em relação a tudo isso. Ela é irredutível sobre a posição ética de não olharmos para o lado e não nos recusarmos a questionar. E eu concordo, e não estou falando sobre desculpas. Eu não estou falando que precisamos de uma retórica de desculpa: “Oh, lamento ter aborrecido você.” Mas o que estou tentando fazer é insistir e dizer “O que faz você sentir aborrecimento?” Eu acho que o processo não é dizermos que somos vegetarianas ou vegetarianos tanto, porque estamos do outro lado deste processo. O processo é descobrir o que é catalítico para aquela pessoa. Ao invés de defender vegetarianismo enquanto as pessoas comem carne, eu digo “Como você consegue continuar comendo carne quando sabe que é cruel?” Eu não acho que temos que defender nossa dieta. Eu acho que não precisamos nem de desculpas nem de defensividade. Eu me lembro do filme Babe. De uma forma, para evitar o consumo, Babe tem que estabelecer sua individualidade e, portanto, sua insubstituibilidade. Ele tem sucesso em ser visto como um corpo com biografia e individualidade, e logo tem sucesso em permanecer vivo. Mas também há um pato tentando estabelecer sua insubstituibilidade porque patos e patas são visto como um coletivo. Esses animais são coletivizados, vistos como termos de massa mesmo quando vivos. Mas uma pata é morta e o cadáver é comido no Natal. No final do filme, quando os créditos estavam passando, dizia que não houve crueldade contra animais neste filme. Então minha filha de seis anos disse “Isso significa que comeram carne falsa?”, o que eu achei muito profundo, porque nós na nossa cultura não achamos que é cruel comer animais. Quer dizer, uma vegetariana de seis anos consegue eliminar uma cultura inteira de desculpas. O que precisamos fazer é criar uma força, e um cara ontem à noite disse que algo inovador demora um tempo pra ser aceito. Ele previu que daqui a 200 anos as pessoas não comeriam animais. E eu disse “Eu não quero esperar 200 anos. Isso é um monte de animais.”


P: Eu não sei se temos 200 anos para esperar.

Q: Bem, sim. Não temos. Eu não posso dizer que tenho um projeto para como resolver estes assuntos de família, porque eu acredito que qualquer assunto que uma família ou casal tiver, onivorismo e vegetarianismo se tornam veículos para despejar estes assuntos de relacionamento que não foram trabalhados. Então, isso se torna mais confuso. Para um casal, por exemplo, o assunto onivorismo/vegetarianismo vai terminar sendo sobre controle: o que pode ser trazido a uma cozinha, e quais panelas podem ser usadas. Todas essas coisas se tornam meios de controlar o comportamento e para manipular assuntos sobre amor e afeição.


P: Isso é porque a carne é uma questão de poder? Isso é parte de todo o processo de pensamento sobre a carne?

Q: Bem, vamos conversar especificamente sobre o que é normalmente o padrão deste casal, que é normalmente que é a mulher que é a vegetariana e o homem que é o onívoro. Eu estava lendo O Contrato Sexual de Carol Pateman. Ela está falando sobre a esposa e o estatuto das esposas. Antes mesmo de termos conversas sobre direitos, antes dessa noção de “fraternidade, igualdade, liberdade,” antes de haver o Contrato Social que é meio que fundacional da filosofia ocidental, havia um Contrato Sexual garantindo acesso sexual a mulheres. Uma das coisas sobre acesso sexual a mulheres é que todo homem deve ter uma esposa, e um dos deveres da esposa é servir o homem. Eu estava pensando sobre isso em termos de carne, porque muitas mulheres dizem para mim: “Eu poderia ser vegetariana, mas meu marido não.” Então, claramente elas estão também decidindo que o humor dele é tão importante que elas não podem atender a suas próprias necessidades. É muito clássico. Onivorismo se torna outro veículo para auto-negação para colocar as necessidades do parceiro e do marido primeiro. E isto se remete a toda a forma como as mulheres se tornam zeladoras, e terminam negando seus próprios corpos e suas próprias necessidades. Eu acho que há o medo da raiva masculina sobre não ter carne em uma refeição. Eu não quero dizer agressão, porque quando homens agridem e usam mulheres como desculpa, isso não é o que está realmente acontecendo. Eles estão agredindo para estabelecer controle, e a ausência de carne é somente sua mais recente desculpa. Pode ser aspirar a casa, pode ser qualquer coisa. No entanto, deve haver muitas mulheres que têm medo do que a ausência da carne significa para seus maridos, e o tipo de raiva que isso geraria. Nós estamos falando de pessoas sem qualquer tipo de análise feminista. Elas simplesmente sabem que não oferecer carne criaria raiva, e isso talvez requeira que examinem o relacionamento, um relacionamento no qual claramente elas não têm muito poder. Então, “carne como uma questão de poder” em termos do que eu argumento em As Políticas Sexuais da Carne deve incluir este entendimento de todo o Contrato Sexual e a expectativa de deveres para esposas.


P: Como uma ética de cuidado feminista pensa sobre animais?

R: Pessoas que comem animais estão se beneficiando de um relacionamento dominante/subordinado, mas nossa cultura encoraja invisibilidade das estruturas permitindo isso, e a invisibilidade dos animais machucados por isso. De fato, os animais são vistos como massas unificadas. Há uma completa negação de sua individualidade, até que isso não é visto como subordinação. Nós vemos carne como a razão ontológica para a existência dos animais, que eles estão lá para serem comidos. Mas quando se fala sobre intervir com uma ética de cuidado feminista, uma das coisas que precisamos dizer é “Pelo que você está passando.” Não é que precisamos dizer isto empaticamente somente a seres que podem falar nossa língua – como um meio de se conectar – mas que nós perguntemos isso à vaca “leiteira”, a vaca sendo ordenhada, a galinha em uma fábrica de ovos, e qualquer animal prestes a ser morto. “Pelo que você está passando?” Primeiro de tudo, para ver a legitimidade desta questão, que animais estão passando por algo, e segundo, para se educar sobre o que esta experiência é. E nós precisamos confiar que se nós nos colocarmos em situações para aprender a responder esta questão, os animais vão nos dizer, de outras maneiras além de palavras.


P: E quanto a onívoros que dizem “Eu adoro o gosto de carne”?

R: Onívoros são muito felizes comendo comida vegetariana, desde que não saibam disso. Uma vez, eu fiz almôndegas de nozes, e todo mundo estava convencido de que era carne. Acharam que eu tinha desistido - “Oh, a Carol desistiu. E isto está delicioso.” E gostaram demais, achando que eu tinha lhes servido animais mortos. Foi muito profundo pra mim, porque era ao símbolo que estavam se agarrando. Seu estômago não viu a diferença, mas enquanto suas mentes estavam perdidas, não importava o que estava indo em seus estômagos. Então eu percebi que era o simbolismo que os prende. O psicólogo de crianças no avião disse que ele sabia que era eticamente errado e que ele esteve ficando cada vez mais tempo sem carne. Mas então, ele diz, ele começa a desejar carne. E eu disse “Me diga o que deseja. O que em relação à carne que você deseja?” “Eu não sei”, ele disse. “É um hambúrguer.” Eu disse “Você deve estar desejando ferro.” Frequentemente pensamos que nossos corpos estão treinados a converter um desejo por uma coisa específica a como nós o treinamos: uma vegetariana que conheci sabia traduzir que, quando desejava filé, estava necessitando de ferro.


P: Então, como conversamos com onívoros?

R: A pessoa com o menor nível de informação determina a discussão. Consequentemente, a pessoa onívora – que geralmente tem menos informação sobre o onivorismo que a vegetariana – determina o nível da discussão. Nós devemos nos levar a esse nível no início. A pergunta é como uma pessoa straz todo o conhecimento para a discussão, por causa da ignorância que está determinando nosso nível de engajamento. Eu acho que esta é uma das coisas mais frustrantes para vegetarianas e vegetarianos: nós falamos em criar um mundo não violento, mas há tanto que nos paralisa de manter essa análise por causa do nível de ignorância no qual o assunto é discutido. O que precisa ser abordado é precisamente o que é excluído pelo nível da discussão.


P: O que você diz quando as pessoas dizem que as vegetarianas têm um problema pessoal com a carne?

R: Por vivermos em uma cultura terapêutica no momento, tudo vai ser visto como um problema individual ao invés de um reconhecimento e compromisso político. Minha resposta é que indivíduos vegetarianos não têm um problema pessoal com a carne. Nós temos um problema com o que as pessoas estão dizendo que é comida. Nós estamos retrocedendo um nível. Então as pessoas terminam dizendo que é puritanismo, que estamos em negação, que somos aceticistas - que nós temos algum problema com o prazer – o mesmo nível de carga despejado sobre feministas anti-pornografia. Mas não há prazer sem privilégio, o privilégio de ser membro da cultura dominante que está dominando mulheres, pessoas de cor, e animais. Nós precisamos ter o privilégio reconhecido e as estruturas sociais que criam privilégios, e a maneira como o privilégio é recompensado através do prazer, um prazer que na verdade resulta do mal a outra pessoa. Tudo se remete de certa forma ao privilégio do controle. Levantar vegetarianismo como um assunto ético diz aos princípios auto-definidos de nossa cultura: “O que alegamos não é o que estamos fazendo.”